Medo de existir
Persiste entre os portugueses uma atitude de recusa de viver e de distância ao poder […] ou mesmo, segundo o conhecido diagnóstico de José Gil, uma espécie de medo de existir, traços estes que, a meu ver, se justificam não só pelas raízes rurais, mas ainda devido à influência de um catolicismo conservador que fomentou a resignação dos fracos ante os poderosos e o espírito de sacrifício dos pobres ante as dificuldades. É claro que também o autoritarismo tutelar do Estado salazarista contribuiu decididamente para acentuar esta mentalidade. Ela exprime-se em atitudes ambivalentes: há uma nítida consciência dos antagonismos que atravessam a sociedade e de que existem oportunidades e privilégios para uns e dificuldades e sacrifícios para outros, mas aparentemente aceita-se isso como uma fatalidade inelutável.1
Estanque, E. (2003) A Classe Média: Ascensão e Declínio, pp. 83-84↩
A Classe Média: Ascensão e Declínio Elísio Estanque José Gil quote sociology